A legalização do jogo no Brasil permitiria a formalização de 450 mil postos de trabalho no “jogo do bicho” e seriam criados pelo menos 150 mil novos. Além disso, os benefícios derivados dos impostos e investimentos poderiam chegar a R$ 20 bilhões por ano (US$ 6,1 bilhões, aproximadamente), segundo observou Magnho José, em uma entrevista concedida ao Yogonet.
O jornalista Magnho José é editor BNLData, um site de notícias com foco em loterias e no setor de apostas. Além disso, é professor de pós-graduação em Comunicação Empresarial na Universidade Cândido Mendes (UCAM), no Rio de Janeiro. Também atua como presidente do Instituto Brasileiro de Jogo Legal (IJL).
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Quais possibilidades reais existem de que o Brasil finalmente aprovará a legalização do jogo?
Entre todas as tentativas anteriores, cremos que esta é a melhor oportunidade para a legalização do jogo no Brasil. A proposta amadureceu gradativamente, o dicurso foi unificado, foi realizado um trabalho sério pelo Instituto Brasileiro Jogo Legal – IJL, através de um diálogo franco com deputados e senadores para esclarecer sobre os benefícios do jogo legalizado, além de minimizar o discurso dos atores contrários a legalização através dos velhos e surrados argumentos que o jogo não pode ser controlado, que a atividade é propícia a lavagem de dinheiro, que gera patologia e favorece o crime organizado.
Que diferença existe entre o projeto que se encontra no Senado e o projeto em debate na Câmara dos Deputados?
Apesar das duas propostas legalizarem os jogos, os projetos são completamente diferentes. O projeto de lei da Câmara dos Deputados, considerado um novo Marco Regulatório dos Jogos do Brasil, é muito mais abrangente e legaliza toda a demanda da sociedade ao legalizar e regulamentar o centenário jogo do bicho (explorado pelos Estados e Distrito Federal), cassino, bingo e vídeo-bingo, jogo online, apostas esportivas, slots-machines ou tragamonedas. Além disso, permite a instalação de bingos e slots-machines em jóqueis-clubes e ainda melhora a operação das loterias estaduais. A proposta também sugere a criação de uma agência reguladora para controlar e fiscalizar todas estas atividades.
O projeto de lei do Senado Federal, que tem as digitais de técnicos do governo federal, é muito restritivo e beneficia algumas modalidades. Esta proposta legaliza apenas parte do mercado hoje operado na clandestinidade como cassino, bingo, apostas esportivas, jogo online, jogos eletrônicos (vídeo-bingo em bingos e slots-machines apenas em cassinos) e o jogo do bicho (explorado pelos Estados e Distrito Federal). Por esta proposta, o Ministério da Fazenda e a Caixa Econômica Federal serão responsáveis pelas operações. O texto do relator, senador Fernando Bezerra Coelho prevê que poderão ser instalados apenas 174 bingos no país e para cada seis cassinos instalados nas Regiões Sul e Sudeste (mais populosas e mais ricas), quatro terão que ser instalados nas Regiões Norte, Nordeste e Centro Oeste. Além disso, a tributação sugerida no texto é alta e vai reduzir em muito a margem de lucro dos operadores.
Quanto dinheiro representaria a indústria do jogo uma vez legalizado e quanto representa o mercado ilegal hoje?
O mercado clandestino do jogo no País movimenta quase R$ 20 bilhões por ano contra os R$ 14 bilhões do jogo legal. O cenário proibitivo não alterou a questão da ilegalidade, já que para cada R$ 3 reais apostados no Brasil, apenas R$ 1 vai para o jogo oficial. Estudos do Instituto Brasileiro Jogo Legal, em parceria com o site BNLData, indicam que além do ganho com tributos e investimentos que podem chegar a R$ 20 bilhões anuais.
Por que considera positivo que o jogo seja legalizado no Brasil?
O Brasil tem uma das legislações mais atrasada e antiquada na área de loteria e jogos do mundo. Ou seja, depois de 75 anos da última lei, ainda não enfrentarmos a questão da atualização do marco regulatório para esta atividade. Apesar do monumental atraso histórico, o Instituto Brasileiro Jogo Legal – IJL ficou entusiasmado com a possibilidade de regulamentação do jogo pelo governo federal para que os recursos advindos desta atividade sejam utilizados como alternativa de criação a novos tributos. Na verdade, aposta em jogos e loterias é uma forma lúdica de pagar impostos. O primeiro benefício seria a retirada destas operações da zona cinzenta e transferida para legalidade, permitindo que haja controle destas atividades. Os benefícios imediatos seriam um incremento na arrecadação de tributos pelo Estado, que seriam revertidos para a sociedade através de programas sociais. Além disso, teríamos a criação de novos equipamentos e atrações turísticas para as cidades.
A indústria do jogo tem grande capacidade de geração de postos de trabalhos diretos. A legalização dos jogos geraria milhares de novos empregos. O Brasil perde oportunidades mercadológicas da cadeia produtiva do jogo, como empregos e divisas. Quando estavam legalizados, os bingos geravam 120 mil postos de trabalhos diretos, entre atendentes, técnicos, garçons, manobristas, administrativos, entre outros. Além disso, haveria a formalização e proteção social para os milhares de empregados, que trabalham hoje em dia para as operações ‘toleradas’ pela sociedade. Dependendo da proposta que for aprovada, serão formalizados 450 mil empregos do jogo do bicho e criados pelo menos mais 150 mil novos postos de trabalho.
Quanto popular é o chamado “jogo do bicho”? Em que consiste?
Todos os dias, mais 20 milhões ou 10% de brasileiros apostam no ‘brasileiríssimo’ jogo do bicho.
O jogo do bicho surgiu no Brasil no dia 4 de julho de 1892 pelas mãos do Barão de Drummond, João Batista Viana Drummond e por sugestão do mexicano Manoel Ismael Zevada, que tinha lançado sem sucesso o Jogo das Flores. O Drummond decidiu fazer uma campanha para conseguir reerguer o Jardim Zoológico de sua propriedade, em Vila Isabel, no Rio de Janeiro, que passava por dificuldades. Assim, o barão listou os 25 animais existentes no espaço e lançou o jogo, estipulando quatro números para cada bicho, que formam as dezenas de 00 a 99. Esse critério é usado até hoje. Na verdade, o jogo do bicho é uma loteria de números, semelhante a Quiniela.
Na sua opinião você acha que a legalização do jogo permitiria ao governo contar com mais renda para reverter a crise econômica que atravessa o país?
Dependendo do modelo aprovado pelo Congresso Nacional, o setor de jogos no Brasil terá condições de arrecadar cerca de R$ 20 bilhões anualmente através da tributação do jogo. Além disso, o governo também poderá arrecadar valores semelhantes ao do montante da tributação anual com a licitação das outorgas para operar as casas de apostas.
Que setores se opõem à legalização do jogo no Brasil? Por quê?
Nas últimas sete décadas, vários temas têm gerado polêmica no Brasil e dentre eles a legalização do jogo, que seja por questões religiosas, políticas, ideológicas, morais têm contaminando e distorcido o debate. O longo período de proibição do jogo no Brasil, cerca de 75 anos, acabou rotulando equivocadamente esta atividade como uma questão moral, a exemplo do aborto e das drogas. Com frequência somos perguntados sobre os motivos do longo período de ilegalidade do jogo, enquanto em praticamente todos os países da América Latina o jogo é legalizado e regulamentado. Temos dificuldades em responder esta pergunta já que não existem fatos explícitos que justifiquem, mas sim o elenco de motivos.
Os maiores culpados pelo cenário caótico em que se encontra o mercado do jogo no país é o Congresso Nacional e parte da mídia, que se omitem em enfrentar a questão do jogo ilegal.
Que aspectos contemplam os projetos de lei sobre jogo on-line?
As duas propostas que estão em tramitação no Congresso Nacional, tanto o PLS 186/2014 no Senado Federal e o PL 442/1991 na Câmara dos Deputados contemplam a legalização do jogo online e das apostas esportivas.
Como você acredita que deveria ser o regime de impostos para o setor, uma vez legalizado o jogo?
Acreditamos que o Brasil deverá seguir a tendência mundial de tributação e taxar o jogo dentro da realidade do mercado, procurando sempre um equilíbrio entre a premiação ofertada, os ganhos do governo e os lucros dos operadores.
Em março de 2014, participei com o diretor de Jogos do Peru, Manuel San Román Benavente do Painel ‘O jogo Legal. Experiências na luta contra o jogo ilegal’ durante o ‘II Seminário Internacional de Loterias – Desafiando o Contexto’ – Mar del Plata. San Román, que enfrentou o jogo clandestino no Peru com muita competência, listou os 7 mandamentos do jogo legal, que concordamos: 01. Regular antes de proibir; 02. A proibição leva ao jogo clandestino; 03. O jogo clandestino leva a corrupção; 04. Jogo é atividade sensível que requer transparência; 05. Política de portas abertas com os operadores; 06. Não se pode regular fora da realidade e; 07. Publicação prévia das normas para críticas e comentários.
Alguns analistas acreditam que, se o Congresso Nacional legalizar o jogo, operadores internacionais operariam os cassinos, enquanto as empresas nacionais cuidariam do setor de apostas desportivas. Qual é a sua opinião a respeito?
Na minha opinião várias operações ficarão com operadores internacionais, outras serão compartilhadas e uma será apenas de brasileiros. Por exemplo, os cassinos serão operados por grandes corporações internacionais. Bingos, jogo online e apostas esportivas serão compartilhadas entre brasileiros e estrangeiros. Já o jogo do bicho será operado exclusivamente por empresários brasileiros. Entendemos que algumas operadoras de videobingos com DNA de tecnologia brasileira serão privilegiadas pelo fato do brasileiro gostar desta modalidade.
Considerando a recente decisão pelo Senado do Brasil aprovando pela maioria a remoção de Dilma Rousseff, como você acredita que esse contexto político impacta o tratamento legislativo do projeto de lei? Você acredita que o novo governo liderado por Michel Temer favorecerá ou prejudicará as possibilidades de legalizar o jogo em seu país?
Não houve e nem haverá mudanças no cenário da legalização dos jogos do ponto de vista do Legislativo e do Executivo. A tramitação dos projetos de lei dos jogos não foi interrompida durante e, nem após, o processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff. Na verdade, o Brasil tem que amadurecer e enfrentar a questão do jogo de forma pragmática, sem o envolvimento de questões de ordem moral ou religiosa. Além disso, com o jogo legal ganham Estado e sociedade. (Exclusivo Yogonet.com – Constanza Heller)
Fonte:
Yogonet.com – Entrevista exclusiva com Magnho José, presidente do Instituto Brasileiro Jogo Legal
BNLdata.com.br